A
EFICÁCIA DO BATISMO.
Rev.
João Ricardo Ferreira de França.
Compete-nos tratar
também deste tema que se relaciona com o Batismo Cristão que é o assunto da
eficácia deste sacramento. Isto é importante porque na tradição romanista o
sacramento do Batismo possui conotações regeneradoras, ou seja, para o
catolicismo romano o batismo opera a salvação.
Outra preocupação que nos faz ocupar deste assunto é fato
de que na tradição evangélica-protestante há uma tendência ao rebatismo como
padrão doutrinário ou mesmo como uma distinção entre os que seguem a doutrina
ortodoxa e os que são heterodoxos ou até mesmo os que são tidos como heréticos.
1
– A Eficácia dos Sacramentos e a Confissão de Fé de Westminster:
Qual é a validade dos sacramentos na vida cristã?
Qualquer pessoa que ministrar os sacramentos deve ser aceito como válido? Geralmente
a resposta que nós oferecemos a estas duas questões é que a validade do batismo
e a sua eficácia depende de quem realizou o sacramento; entretanto a Confissão
de Fé de Westmister apresenta uma resposta interessante:
III.
A graça significada nos sacramentos ou por meio deles, quando devidamente
usados, não é conferida por qualquer, poder neles existentes; nem a eficácia deles depende da piedade ou
intenção de quem os administra, mas da obra do Espírito e da palavra da
instituição, a qual, juntamente com o preceito que autoriza o uso deles, contém
uma promessa de benefício aos que dignamente o recebem.
A declaração da Confissão de fé neste particular assegura
que a validade dos sacramentos não é dependente da piedade (santidade) ou da
intenção (pressuposto teológico) daquele que o administra. Isto se aplica aos
dois sacramentos ordenados e estabelecidos pelo Senhor.
2
– A Validade e Eficácia do Batismo:
A doutrina da comunhão dos santos é expressa no credo
apostólico “Creio na Comunhão dos Santos” – geralmente se entende aqui uma
comunhão mística e também a santa ceia como sendo a forma visível desta
comunhão, pois, ela expressa a unidade da Igreja.
Mas, quando estudamos a Carta de Paulo aos Efésios
encontramos Paulo dizendo: “Há uma só fé, um só batismo” (Efésios 4.8). Será
que a doutrina do sacramento do Batismo expressa exatamente a unidade? A
unidade da fé expressa pelo Batismo tem deixado de ser analisado; e tem-se
colocado para a Igreja uma postura de sermos negligente a este particular.
Quando lemos esta expressão Paulina nos vem a mente a
prática do rebatismo dentro da tradição evangélica-protestante. Está correto a
prática do rebatismo? Quando presbiterianos, congregacionais, luteranos,
anglicanos e reformados são recebidos em outras comunidades evangélicas são
automaticamente constrangidos a rebatizar-se. Será que isso é válido?
A Confissão de fé de Westminster quando toca nesta
temática nos traz a lume uma resposta importante: “VII. O sacramento do batismo deve ser administrado uma só vez a uma mesma
pessoa”
A Confissão de Fé assegura-nos que o sacramento do
Batismo deve ser administrado uma só vez sobre a mesma pessoa. Esta posição
adotada é uma forma de combater os anabatistas que não aceitavam o pedobatismo;
bem como aqueles que julgavam o modo de batizar por aspersão errado e
procuravam rebatizar por imersão. A Confissão de fé usa o texto de Tito 3.5
como fundamento para a sua posição.
Mas, a grande questão é: Quanto aos que são oriundos do
Catolicismo Romano, eles devem ser rebatizados? O tema em si mesmo é
melindroso, polêmico e incômodo, pois, o presbiterianismo brasileiro é um dos
poucos no mundo a rebatizar católicos quando estes se convertem ao
protestantismo.
3
– Os Reformadores e a Validade do Batismo na tradição cristã:
Devemos considerar a posição dos principais reformadores
quanto a questão da validade do Batismo, como eles de fato encaravam o
sacramento para entendermos a problemática a respeito deste polêmico assunto.
Qual era a concepção dos primeiros reformadores a
respeito da validade eficácia do Batismo como sacramento estabelecido por
Cristo Jesus na Igreja? A sabedoria da igreja (ou ignorância como alguns
poderão alegar) deve ser sempre ouvida quanto a este assunto, a catolicidade da
Igreja reclama ser ouvida neste particular, inclusive na tradição Reformada.
3.1
– Martinho Lutero:
Há muitos que asseguram que a validade do batismo está
vinculado a quem administra: por exemplo, se for o batismo efetivado pelo
pastor (evangélico ou protestante) este batismo deve ser aceito como válido,
mas se for realizado por um sacerdote católico romano deve ser rejeitado.
Curioso
é que este pensamento nunca esteve presente na mente dos primeiros
reformadores, incluindo Matinho Lutero que afirma que o ser humano batiza e não
batiza, então ele explica: “batiza, porque efetua a obra ao submergir o
batizando. Não batiza, já que nesta obra não age por sua própria autoridade,
mas representa Deus[...]” e ainda informa que “o batismo que recebemos por mãos
de um ser humano, não é do ser humano, mas de Cristo e de Deus”.
A validade e eficácia do sacramento batismal não se
vincula a intenção ou a pessoa quem o administra. Uma vez que este sacramento é
outorgado por Deus à igreja por meio de um mandato divino, e o que o torna válido
é invocação do Deus trino para isso, então, não demérito no sacramente por
causa de quem o administra.
3.2
– Ulrich Zwínglio:
Um dos reformadores pouco conhecido no Brasil chama-se
Zwínglio ou Zuínglio foi reformador na cidade de Zurique na Suiça, ele
sustentara que o batismo e a santa ceia não eram meios de graça, para ele estes
sacramentos nada carregavam de redentivo..
Para este reformador o sacramento do Batismo era símbolo da unidade, por isso,
admite um só batismo.
3.3
– João Calvino:
O reformador francês que residiu em Genebra e naquela
cidade desenvolveu o ministério da Palavra. Elaborou uma teologia dos
sacramentos que se faz presente em todas as confissões de fé reformadas
incluindo os Padrões de Westminster (padrões doutrinários na Igreja
Presbiteriana).
Calvino segue a definição agostiniana para os sacramentos
“uma forma visível de uma graça invisível”O
reformador de Genebra chama o sacramento do Batismo de uma “marca de nosso
cristianismo” e do “sinal no qual somos recebidos na Igreja, para que
enxertados em Cristo sejamos contados entre os filhos de Deus”.
Quanto ao tema da validade e eficácia do Batismo Calvino
revela que tanto um quanto o outro não depende de quem celebra o sacramento,
porque devemos receber o batismo como “se o recebêssemos das mãos do próprio
Deus[...] pode-se deduzir daqui de que nem se tira, nem se acrescenta nada ao
Sacramento a causa da dignidade de quem o administra [...] quando se envia uma
carta não se importe quem seja o portador”.
A tradição cristã Reformada nos deixa o
legado de que o batismo tem a sua validade eficácia não por causa da intenção
de quem administra. Isto também é assegurado na Confissão de Fé de Westminster
quando trata dos sacramentos: “[...]; nem
a eficácia deles depende da piedade ou intenção de quem os administra, mas da
obra do Espírito e da palavra da instituição, a qual, juntamente com o preceito
que autoriza o uso deles, contém uma promessa de benefício aos que dignamente o
recebem. Ref. Rom. 2:28-29; I Ped. 3:21; Mat. 3:11; I Cor. 12:13; Luc.
22:19-20; I Cor. 11:26.”
O que nós aprendemos aqui sobre a validade
e a eficácia do sacramento do Batismo? Que para “a validade do sacramento é
essencial que seja ministrado ‘em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo’”.
Ou seja, quando lemos Mateus 28.19 temos alí o designativo de Deus que dá
sentido e validade ao Batismo.
3.4 – O Anabatismo e sua
Influência na Tradição Presbiteriana Brasileira.
Já vimos que a Reforma Protestante
rejeita de forma peremptória a ideia do rebatismo seja de protestantes ou
católicos. Entretanto, como essa prática de rebatizar chegou nas igrejas
evangélicas e protestantes?
Existiu um movimento paralelo à
Reforma chamado de Reforma Radical que é conhecido como Anabatismo. Conhecidos
na história como Rebatizadores. Eles advogavam que o Batismo Infantil praticado
pela Igreja Católica Romana era nulo em seu sentido, e por isso, passaram a
rebatizar os que haviam sido batizados na infância, entretanto, as Igrejas
oriundas da Reforma praticavam o pedobatismo, e logo, também foram alvos de
críticas dos anabatistas que também
passaram a rebatizar os protestantes que eram aspersionistas e pedobatistas.
Tanto os Luteranos quanto os
Calvinistas se opuseram ao movimento da Reforma Radical que questionavam a
validade não apenas do modo de batismo (aspersão), os sujeitos (no caso os
bebês) e a validade do batismo católico romano. No decorrer dos anos as igrejas
evangélicas e protestantes, estas últimas, nunca rebatizadoras, agora se veem
na obrigação de rebatizar católicos convertidos à tradição protestante ou
evangélica.
De modo particular o
presbiterianismo brasileiro possui conotações anabatistas. No ano de 1888 o
sínodo da IPB se reuniu sob a presidência do Rev. Blackford onde oficialmente a
igreja presbiteriana do Brasil adotara os padrões de Westmisnter e nomeou uma
comissão para tratar da validade ou nulidade do batismo católico romano. E essa
comissão ao que tudo indica era favorável a validade do batismo romano. Isto
ficar evidente na ata daquele concílio. Entretanto, o sínodo não aceitou o
relatório da comissão. Havendo uma contestação por meio de um protesto da
própria comissão que ficou lavrada na ata do sínodo, que declara:
Nós,
abaixo assinados, protestamos contra a decisão do Sínodo, declarando inválido o
batismo romano, visto o acharmos inconveniente: (1) Porque grande maioria dos
teólogos da Igreja Protestante, incluindo Lutero, Calvino, Cumingham, os Hodges
(Charles e Alexander) pai e filho, Patton, Schaff, Briggs e outros homens
ilustres o têm como válido; (2) Porque é fato histórico que um só ramo da
Igreja Presbiteriana do Sul dos Estados Unidos da América se declara contra a
validade desse batismo e o Sínodo por este ato se opõe à posição das Igrejas
chamadas Reformadas; (3) Porque as igrejas metodistas e Episcopal reconhecem
ambas esse Batismo, e deve toda harmonia possível em questões dessa ordem; (4)
Porque nessa questão deve haver a maior caridade possível.
A prática de rebatizar pessoas que vieram
do Catolicismo Romano prevaleceu na identidade protestante presbiteriana
brasileira. A alma católica dos evangélicos brasileiro desconhece o fato de “que
os evangélicos no Brasil estão entre os mais anti-católicos do mundo. Só para
ilustrar (e sem entrar no mérito dessa polêmica) o Brasil é um dos poucos
países onde convertidos do catolicismo são rebatizados nas igrejas evangélicas.
”
No século XX esta prática “anabatista” na
Igreja Presbiteriana do Brasil voltou a ser questionada pelo Rev. Salomão
Ferraz no ano de 1915 publica seu livro Princípios
e Métodos. Ferraz declara: “A inovação, a esquisitice, não é o fato de
aceitar-se a validez do batismo da igreja romana, mas é exatamente o oposto. A
praxe do rebatismo é que vem de encontro ao consenso da igreja universal, não
só na atualidade, como desde as eras mais remotas, como teremos ocasião de
demonstrar”
Neste mesmo livro Ferraz falando da
nutrição espiritual que bons livros de tradição católica nos oferecem como a imitação de Cristo. Assegura-nos que
tanto protestantes como católicos são beneficiados pelas linhas deste livro. E
que é uma loucura relegar a Igreja Romana como não cristã:
E
era esse mesmo livro [a Imitação de
Cristo] o predileto dos Whitefields e dos Wesleys, como ainda o é de
milhares de cristãos evangélicos em nossos dias. E entretanto, só nós os
protestantes é que possuímos toda a verdade, toda a santidade, toda a piedade,
toda a doçura, toda a pureza e abnegação, toda a consagração e caridade; só nós
é que temos direito ao nome de cristãos, e os católicos romanos, mesmo os mais
piedosos e sinceros, esses, coitados! De cristãos só tem o nome, o rótulo, e
mais nada! É o cúmulo da paixão partidária, é o extremo da cegueira de um
sectarismo estreito e pernicioso!
Salomão Ferraz sumariza as razões pelas
quais deve-se ir contra o rebatismo de católicos convertidos na fé cristã
protestante:
Resumindo as
nossas considerações, nós tiramos a conclusão de que a prática de rebatizar os
romanistas, que se unem às igrejas evangélicas, é inteiramente descabida e
insustentável, e isto pelos seguintes modos: a) É anti-católica e atentatória
contra a catolicidade da igreja de Jesus Cristo, como é reconhecida em nossas
doutrinas evangélicas. b) Vem de encontro à letra e ao espírito das Escrituras
e dos nossos símbolos presbiterianos e ao uso de toda a igreja. Diz o Dr.
Charles Hodge: ‘Nós não temos autoridade escriturística nem exemplo para a
repetição do rito do batismo; e tal repetição é proibida pela nossa Confissão
de Fé e contrária ao uso de toda a igreja cristã.’ (Church Polity 214).
No
entendimento protestante a validade do batismo romano não se deve por causa da
intenção e nem por causa de quem o administra; quando se nega a validade deste
sacramento está se traindo toda a tradição da igreja cristã durante muitos
séculos. Os teólogos reformados do século XVII afirmaram peremptoriamente que
há validade sim no rito do batismo praticado no romanismo, Francis Turrentin
declara:
A
verdade acerca da doutrina do batismo pode ser considerada seja em sua
essência, ou a seus efeitos, ou os ritos e as cerimônias usadas nele. No
sentido anterior, reconhecemos que pela providência singular de Deus a doutrina
verdadeira acerca do batismo permanece na Igreja
de Roma porque nela se retém a
essência do verdadeiro batismo, a saber, a água e a fórmula prescrita por Cristo,
segundo a qual é administrado em nome da Trindade. Por essa razão, o batismo
realizado nesta igreja é considerado válido e não pode ser repetido.
Então,
quando analisamos a questão do rebatismo na tradição presbiteriana brasileira
percebemos que a igreja no Brasil ignora completamente a catolicidade da igreja
(o que a igreja sempre praticou ao longo dos séculos) e a sua própria tradição
Reformada.
Na igreja da américa o
presbiterianismo norte-armericano no ano de 1835 na Assembleia Geral da Igreja
Presbiteriana havia declarado que a Igreja Católica Romana não “era uma igreja
cristã”, e disso decorre o fato da nulidade de seu batismo. Grandes eruditos
apoiaram essa decisão, entre os quais encontramos: Nec Grill e o eminente
professor James H. Thornwell e os contrários a posição da Assembleia Geral
encontramos Dr. Lorde e o sr. Atken. A Igreja Presbiteriana da América naquela
ocasião, pela grande maioria declarou “nulo o batismo realizado pela Igreja
Católica Romana. ”
Entretanto, em 1845 o eminente
teólogo de Princeton o dr. Charles Hodge levanta objeções significativas a
decisão da Igreja Presbiteriana quanto a este particular, e as palavras dele
poderá ser muito bem dirigida à Igreja Presbiteriana em nossa nação:
Estariam os homens
dispostos a perguntar que nova luz foi descoberta? Que austera necessidade
induziu a Assembleia a declarar que viveram e morreram não batizados Calvino,
Lutero e todos daquela geração, bem como milhares que tendo somente o batismo
romano foram recebidos nas igrejas protestantes?
Trinta anos depois, essa resolução
foi abolida. Entretanto, a resolução deixou a encargo dos conselhos locais a
decisão de receber ou não por rebatismo os oriundos da Igreja Católica Romana,
alguém declarou que tal resolução foi uma declaração de incapacidade teológica
significativa.
No Brasil não se pode acusar a igreja aqui deste tipo de postura, mas pode-se
dizer que nem tal incapacidade é cogitada, pelo contrário a postura anabatista
é preferível porque parece ser mais cômodo.